Opinião

Diário da Peste. Ei, ei, estou aqui!

4 de abril

Ei, ei, estou aqui!
De França, um sms de manhã. Em paris não há coletes amarelos.
Notícias à distância.
Muitos ventiladores chegam este domingo aos aeroportos.
Trump avisa que não vai usar máscara.
Manu Chao vai mandando músicas pelo seu canal Youtube.
Coronarictus Killer Sessions. E ri.
No El Pais falam do regresso de um cantor que se escondeu durante anos.
Não tem telemóvel.
Abandonou os espectáculos,
“Não me quero sentir um boneco na tempestade”
Actua escondido em pequenos bares.
Já o fez em Lisboa, no bar BUS.
Roma, a minha pastora de Berna, está bem.
Está presente e está próxima.
Os animais fazem isto melhor do que os homens.
Ou dormem ou estão presentes.
Jeri, a golden, recebe-a com alegria e espanto.
O veterinário abriu uma clareira na pata para a ferida ficar evidente.
Uma clareira para melhor revelar o problema.
Lição de medicina e de biografia.
Clareira e clarificar têm a mesma origem.
Em Londres drones quase discursam na altura do baixo céu.
O baixo céu é o céu a que as máquinas têm acesso.
Os drones dizem numa gravação:
Só deve sair de casa por questões de saúde, alimentação, etc.
Uma gravação bem extensa de recomendações de segurança.
Lembra as instruções de funcionamento de uma máquina.
Mas aqui são instruções de uma máquina para os humanos funcionarem.
Imagino drones que dão instruções sobre o funcionamento das pessoas em actividades simples.
Um drone por cima de um carpinteiro a dar instruções de como usar as ferramentas.
Um drone por cima de um ministro dando-lhe instruções sobre o discurso certo.
Drone por cima de um pintor sugerindo cores, traços, linhas.
Esquecer o que está lá fora.
Vi há poucos dias o filme “Embriagado de mulheres e de Pintura” de Im Kwon-Taek.
O pintor preparado para pintar, a tela no chão - mas a mulher segreda-lhe algo ao ouvido.
Como se lhe desse instruções para a pintura.
Uma mulher, não um drone.
Fazer uma performance assim.
Imagino que a mulher tem um segredo que faz o pintor pintar.
Ele só venderia um quadro de que gostava muito "quando o mar secasse" - diz-se no filme.
Substituir aulas presenciais por aulas vindas de drones.
Um drone em cima de cada aluno até o aluno aprender tudo.
De A a Z, e do zero ao infinito.
Se o aluno não aprender, o drone envia um pequeno choque eléctrico, diz alguém.
Ideia sensata, mas difícil tecnicamente – diz outro.
Ideias perversas para um novo século que está ansioso por começar antes do tempo.
Nos Estados Unidos, em duas semanas, dez milhões de novos desempregados.
Hans Magnus Enzensberger.
“que alguma coisa tem de ser feita e já
isso já sabemos
que porém ainda é cedo para fazer alguma coisa
que porém é tarde demais para fazer alguma coisa
isso já sabemos”
Exigir na via pública drones que transmitam música.
Pelas ruas de londres, paris, roma, nova iorque, buenos aires e madrid.
Alguém me recomenda twist and shout dos Beatles, mas sem tirar os pés do chão.
Um homem dança a dois uma salsa diante de um espelho alto. Espelho com altura bípede e largura certa.
Dança consigo próprio, mas está entusiasmado.
Toca no espelho como se o espelho também tivesse mão.
Sem espelhos estar em casa seria bem mais duro.
A minha amiga grega manda-me uma mensagem.
“O meu pai (saída por motivo 4) recebe-me todos os dias no seu pátio (já não entro em casa) com um cálice de aguardente.”
Chama-se rakí, a aguardente.
Os pais sabem, ainda assim, receber os filhos.

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