Até aos seus últimos anos, Eduardo Lourenço manteve o hábito de escrever em qualquer pedaço de papel que lhe aparecesse: agendas, cadernos, diários, convites. Um costume que vinha de longe, dos tempos em que foi primeiro estudante e depois professor assistente em Coimbra, anos 40 e inícios dos 50. Todos esses escritos fazem parte do espólio que ocupa uma sala inteira da Biblioteca Nacional (BN), em Lisboa, dossiês cujo conteúdo é, numa grande parte, ainda inédito. O Expresso passou várias semanas a descobri-lo e o resultado é um trabalho que será publicado na revista E deste sábado.
Lá estão as pequenas agendas revestidas de cabedal que o professor usava e escrevinhava de alto a baixo, sem ligar às datas, as primeiras edições dos seus livros, sebentas, cadernos, os diários — o mais antigo é de 1940, quando ele assinava Eduardo de Faria. Lá está o desenho de um móvel para a casa em Montpellier, onde viveu em 1955, depois dos anos passados em Bordéus, Hamburgo e Heidelberg, e antes de embarcar para o Brasil. As fotografias da família, de si mesmo, da longa união com Annie Salomon, os poemas, até um dossier com as capas dos futuros livros que haveria de escrever, muitos do quais não aconteceram, como “Noûs Poetikos — Ensaio sobre a realidade poética como centro da realidade humana”, de 1948; ou “Spartacus”, peça de teatro da qual redigiu até o 2º ato, em 1949. Em 1950, as primeiras provas tipográficas de “Heterodoxia I” surgem emendadas pelo punho e letra de Miguel Torga. Em 1954, o projeto “O Pão e o Circo ou O Futebol” mostra Eduardo Lourenço interessado já no tema de Portugal e da sua mitologia, que abordaria nos anos 70.
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